quinta-feira, agosto 5
O Meu Château Cheval Blanc 1961
O Meu Château Cheval Blanc 1961 - Quem assistiu ao filme Sideways, talvez lembrará que a personagem central do filme, um emblemático e depressivo enófilo, guarda durante todo o filme sua garrafa de Château Cheval Blanc, safra 1961. É a pedra de toque de sua (dele) vida. Aguardando "O" momento, vive sua antinomia diária à espera da perfeição inalcançável.
Cada um de nós tem essa sua garrafa especial guardada, à espreita de um momento que julgaremos perfeito. Pode não ser especificamente um vinho, mas um pedido de desculpas, um gesto de afeto, enfim, somos seres engraçados em solapar os prazeres à espera de um Grand Finale.
No meu caso, minha garrafa especial existe sim. Foi comprada em 1998 quando estive na Copa da França. É um vinho barato, um Bordeaux até simplório mas que foi feito em comemoração à Copa de 1998, que tanto me marcou. Foi minha primeira viagem à Europa e também minha primeira Copa do Mundo. Comprei 3 destas garrafas. Uma delas, num descuido de alguém, tombou em pedaços no chão de um antigo apartamento. Sobram-me duas outras que foram redescobertas uns anos atrás, na adega encostada. Aliás, por falar em vinhos baratos, estes acabam talvez marcando mais a história para alguns do que para outros, como foi o caso do célebre encontro de John Winston Lennon mais 3 outros garotos de Liverpool e um certo Bob Dylan em NYC.
Voltando às minhas tão caras garrafas de vinho barato, de lá para cá, nem mesmo tantos momentos maravilhosos que já passaram me fizeram apreciá-las, no que culpo mais uma certa inapetência gastronômica do que efetivamente falta de excelentes, para não dizer extraordinárias oportunidades que tive, para fazê-lo. Confesso que vivi, também. E bem intensamente os anos passados. De uns tempos para cá, muito motivado pela temporada paulistana quando novamente abracei a enogastronomia como um passatempo necessário, me veio à lembrança as tais garrafas de Bordeaux safra 97 que guardo há tanto tempo.
Um amigo próximo já me demoveu de vez da idéia, que talvez não tivesse mais, de guardá-los por mais tempo. Chegou até a duvidar de que tenham resistido tanto, o que também não duvido. De qualquer maneira, estas linhas de hoje são para lhes dizer, caros leitores, que as duas estão com os dias contados. Serão abertas em breve, a primeira já na noite de hoje.
Somente assim os rituais de passagem acontecem. Me peguei hoje pensando nessa hipótese e elucubrando sobre o tempo das nossas vidas. Já falei por aqui sobre essa nossa insistência burra, quando discorri um pouco sobre o filme Casablanca. Mas, insisto: temos a teimosia de esperar e sempre depreciar o tão precioso HOJE, em detrimento de um ser meio esquisito chamado AMANHÃ. Ainda sobre cinema, acho que não precisamos da cena magistral de Apocalipse Now do Copolla, ao som de Cavalgada das Valquírias de Wagner, como pano de fundo para um momento ímpar. Se der, melhor ainda, senão, talvez arriscar que venha não valha a pena a espera.
Carpe Diem, que tem sua origem num poema de Horácio, revelará que a expressão latina indica que o dia é como um fruto maduro, que há de ser, desta forma, colhido, apreciado. Recomendo, amigos leitores, que façam o mesmo, pois a vida é inegavelmente curta.
Minha nova fase me recomenda isto. Chega de guardar os vinhos empoeirados e vamos apreciá-los, porque emblematicamente vivos. Também é hora de dar chance às novas safras, novos aromas, sabores e mistérios que os vinhos e as metafóricas videiras de nossos caminhos apresentam. Detesto chegar ao lugar-comum, mas de tanto guardar bens materiais e emoções imateriais, podemos desgastá-las e a nós mesmos.
Enfim, o meu Bordeaux 1997 vai já para a lista dos apreciados. Tire a poeira dos seus também e me acompanhe! :)
E La Nave va...
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4 comentários:
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Emerson, temos a mania dos primeiros!Quer seja nas nossas memórias ou na "malinha de recordações".Guardamos tudo quanto foi primeiro até onde a lembrança nos permite alcançar.Os bens materiais são só temporários.A vida é apenas um segundo.Segundos de hoje seguidos do amanhã.Abra suas garrafas e liberte-se das amarras do pensamento do rancor.Porque tudo passa tão rápido.Na verdade nada nos pertence.Cheers!!!
ResponderExcluirMinha garrafa de Bordeaux safra 97 já foi aberta, degusta e eternizada na memória. Não haviam Valquírias, margaridas, açucenas ou qualquer aroma de fundo. Acho que é porque não esperei. O tal do viver o agora foi o pano de fundo para sacar a rolha.
ResponderExcluirGostei muito do texto, me trouxe a lembrança que vivo a cada dia com taças na mão e sorriso no rosto.
Obrigada. =)
Olga, qdo escrevemos alguma coisa, pensamos que aquilo poderá encontrar um eco nos leitores. Fico muito feliz mesmo que tenhas compreendido tão bem o espírito do texto. Cheers mesmo!
ResponderExcluirbjos e comente sempre, aqui, sempre digo, os comentários são sempre mais interessantes que o próprio texto :)
bjos amiga
Gostei bastante de seus comentarios . Vou usar a minha garrafa para um momento em familia com meus filhos para um verdadeiro momento de afeto e prazer. Valeu pelo post
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